O hospital Colônia Santana foi inaugurado
em 10 de novembro de 1941, no municÃpio de São José em Santa Cataria, durante o
governo provisório de Nereu Ramos. Distante 25 km da capital do estado, o
hospital seguiu um modelo instituÃdo pelo psiquiatra Philippe Pinel, na França.
Por ter toda essa distância da capital do estado a comunidade local foi se
formando próxima as redondezas do hospital vindo assim futuramente a se
conhecer como Colônia Santana e o hospital por sua vez em 1996 se tornando
Instituto de Psiquiatria do estado.
A história que temos a contar hoje se
passar cerca de 15 anos após a inauguração do Hospital, então sem mais delongas
ela deve começar a ser contada...
Era uma
tarde quente de janeiro, ainda mais dentro da sala do diretor clinico do
Hospital Colônia Santana, o Doutor e Professor Durval da Costa Filho, muito bem
arrumado, de gravata e cercado por livros e estantes ele suava como um
operário, reparava que o vento que adentrava as grandes janelas não era o
suficiente para lhe refrescar. Naquela tarde Dr. Durval estava com as papeladas
dos internos que haviam chegado ou ainda estavam para chegar no ano de 56.
Esquizofrênicos,
Dependentes, Doentes, Deficientes e todos aqueles que na época eram vistos como
amaldiçoadas por deus, marginalizados, banalizados, abandonados por suas
famÃlias, jogados na sarjeta, esperando o tempo despejar sobre eles a poeira do
esquecimento, todos eles estavam ali, rumando para o que seria o seu grande
éden, o Hospital.
Diante
de tanto papel e suor a porta do escritório de Dr. Durval toca, o doutro ergue
a cabeça, larga os papeis para o lado, ajeita seus óculos e – Pode entrar.
- Boa tarde Dr. Durval, com a sua licença?
- Com toda a minha licença, entre e sente-se por favor.
Um homem grande, com a barba bem feita,
cabelos grisalhos e um olhar ditador entra na sala, fecha a porta, se senta na
cadeira a frente da mesa portadora de papeis, estava fardado e mantinha uma
postura rÃgida parecia suportar o dobro do calor que fazia naquela tarde.
- Iria lhe oferecer sombra e água fresca. A sombra nos temos
e não adianta de nada e a água já não está aguentando fresca nesta sala – Dr.
Durval se levanta, pega uma jarra no criado mudo ao lado, coloca água em um
copo e entrega ao homem. – Porém, pegue por favor.
- Obrigado Doutor.
- Bom, não há de que. – Senta-se novamente – A que devo o
prazer de receber o Delegado geral do Estado aqui no Hospital Colônia Santana
em uma tarde de calor infernal dessas? – Sorri.
- Foram 25 quilômetros de muito chão, mas a gente aguenta, o
prazer é todo meu Doutor e antes de mais nada já quero me desculpar por não ter
avisado ou comunicado sobre a visita antes, estou vendo que está cheio de
trabalho por aqui. – Olha a mesa e os papeis sobre ela.
- Oh sim, é meu
terceiro ano aqui e devo dizer que já estou acostumado com isso, a entrada de
pacientes no mês de janeiro é sempre muito grande, tenho feito algumas
pesquisas a respeito do por que deste número grande de entradas no começo do
ano. Mesmo tendo diversas variáveis positivas para justificar como, as férias o
fim das festas de fim de ano com famÃlia, momento que emoções e decisões são
tomadas, envolve muito sentimento sabe? – Olha para a janela – Concluindo, acho
que devo levar em conta a variável calor, o verão e o sol mexe com a cabeça das
pessoas. – Se aproxima do delegado com o olhar por cima da mesa, ergue o dedo
sobre a orelha e gira. – Deixa o pessoal mais biruta.
Ao
notar o semblante serio do delegado finaliza – É claro que estou brincando,
gosto de quebrar o gelo, odeio formalidades e devido a isso, vamos lá sem
desculpas, diga o que o senhor procura.
Ajeitando-se na cadeira o Delegado puxa uma
maleta que havia deixado nos pés da cadeira, a posiciona em seu colo, abre e
retira um envelope de dentro dela.
- Dr. Durval, venho lhe pedir um favor,
olhando para a sua situação atual diria que pouca diferença irá fazer para a
quantidade de trabalho que você tem aqui. – Entrega o envelope para o Diretor
do hospital. – Te trouxe um novo paciente.
Se Doutor Durval estava suado
envolto com todos os seus papeis e gravata, ele empaleceu e o suor que saia
quente gelou, finalmente trazendo o refresco que ele tanto queria. Com as mãos
tremulas o experiente médico pegou o envelope, que tipo de paciente o delegado
geral do estado de santa Catarina iria trazer para o jovem Hospital Colônia
Santana. Um filho bastardo, uma amante histérica, um rival polÃtico? Tudo era
possÃvel nas terras ermas que ele morava.
- Desculpe delegado, mas do que
se trata? Precisa-se de um laudo médico para fazer internações, qualquer coisa
que não seja isso aqui dentro deste envelope não será o suficiente para deixar
alguém aqui.
- Apenas abra por favor...
O Doutor tinha com ele um mal pressentimento, mesmo assim abriu o
envelope, com as mãos suadas retirou uma folha, era uma espécie de ficha,
referente a uma pessoa, um homem adulto, por volta de 28 anos, tinha uma barba
espessa negra, os olhos rodeados de um roxo e um semblante sério, ao ler, não
acreditou, a ficha se tratava de um homem que ele já conhecia, não
pessoalmente, o que era pior, conhecia pelas recentes notÃcias vindas dos
jornais da capital.
- Eu não estou entendendo Senhor Delegado,
este é
- Tião da Barra, O Homem de preto, Facão do
Pantanal, ou como recentemente descoberto Sebastião da Silva de Jesus. Vejo que
você o conhece doutor Durval, o que não é nenhum fato surpreendente, a morte de
duas famÃlias inteiras em apenas uma noite na barra da lagoa e o assalto à casa
do prefeito não é algo que passaria despercebido, até mesmo aqui, neste fim de
mundo.
- Sim, sim, elementar delegado, mas mesmo
assim, ainda não entendo o motivo de sua visita, queres um favor meu, pois peça
o.
- Quero que deixe Tião aqui, em um quarto
do hospital, por um fim de semana, na sexta feira o traremos aqui, ele fica até
segunda de manhã, quando eu voltar aqui com a escolta para leva-lo até Blumenau.
Fechado?
- Senhor delegado, com todo o respeito, ele
não é nenhum paciente, e se não é do fruto de sua maldade todos estes feitos
horrendos, deve ser algo patológico e para isso deveria passar pela mão de
alguns colegas meus, para serem realizados exames, testes afim de formatar um
laudo para a sua internação, alias ele é um criminoso perigoso, não temos guarda nem como manter ele aqui, vamos correr muitos ris...
- Oraaa Doutor Durval, vamos ser sinceros
um para o outro, metade dos pacientes daqui não tem mal nenhum, são malucos ou
rejeitados por suas famÃlias, são estorvo para o povo, pessoas que não valem mais
nada, eu quero que este criminoso fique aqui por dois dias e ele ficara, sem guarda, dessa maneira não vamos chamar a atenção de nenhum criminoso envolvido nos supostos esquemas de fuga do Tião – Se
aproxima do doutor. – Ou quer todos os escândalos de abuso, subordinação,
trabalho escravo e torturas que rondam seus hospitalzinho de merda vazando
igual as fezes de um neném vazam na fralda por todo o estado?
Durval estava encharcado, se aconchega na cadeira, queria ser engolido
por ela, queria que o calor fosse para o raio que o parta junto com o delegado
e aquele assassino maluco. O motivo não era apenas Tião da Barra, mas as
suspeitas que vários criminosos estavam tramando o seu resgate antes da partida
para Blumenau. Durval deixa a gravata mais frouxa e diz. Está bem, ele fica
esse fim de semana, e nada vaza, seu delegado.
- Perfeito. – O delegado se ergue da
cadeira. – Eu agradeço o favor, e não se preocupe com os criminosos, eles não vão
achar Tião aqui na Colônia Santana até segunda feira. – Aperta a mão de Durval,
se dirige até a porta, abre ela e antes de voltar para a capital se despede. –
Isso é claro, se nada vazar, até Doutor.
A porta se fecha, Durval joga a ficha de Tião na mesa, cogitou em rezar
para deus, algo que já abandonou a muito tempo desde o começo de sua faculdade
em Lisboa, sabia que talvez nem Deus acharia aquele Hospital, torcia para nem
ele conseguisse mesmo!
Atordoado o Doutor se levanta, segue até uma prateleira de seu
escritório e a abre para uma coleção repleta de uÃsques, haviam diversas
abertas devido a alguns goles que ele dava, porém foi direto na única garrafa
lacrada, uma de Bourbon, abriu apressadamente e tomou no gargalo.
- Vamos rezar.